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EIXEIRA
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2014; 60(6):502-504
HomEnagEm
Adib Jatene, enorme legado à medicina brasileira
http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.60.06.002A data de 14 de novembro de 2014 icará marcada para
sempre na história brasileira como o dia em que a medi-
cina nacional perdeu uma de suas maiores referências: o
cardiologista Adib Jatene.
Nascido emXapuri, no Acre, ilho de um seringueiro li-
banês, escreveu um dos mais belos capítulos da história da
medicina nacional. Formado pela Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo (FMUSP), em1953, onde tam-
bém se tornou professor emérito, ainda acumulou cargos
no Hospital do Coração (HCor) e no Instituto Dante Paz-
zanese, duas referências nacionais em cardiologia.
Jatene foi um dos pioneiros da cirurgia cardíaca no
país. Além de ter criado o primeiro coração-pulmão ar-
tiicial no Hospital das Clínicas, na década de 1950, foi
responsável pela primeira cirurgia de ponte de safena
no Brasil, em 1968. Suas contribuições em prol de téc-
nicas para o desenvolvimento da cardiologia incluiu seu
nome entre os mais respeitados cirurgiões cardíacos do
mundo. Um dos procedimentos desenvolvidos por ele,
com o objetivo de corrigir artérias transpostas em re-
cém-nascidos, icou conhecido mundialmente como “ci-
rurgia de Jatene”. Em seu currículo invejável, constam
mais de 20 mil operações, além de quase 700 trabalhos
cientíicos publicados na literatura nacional e interna-
cional como autor e coautor. Um deles, relacionado
à técnica de correção intracavitária, publicado no
The
Journal of Thoracic and Cardiovascular Surgery
, alcançou,
somente na literatura médica internacional, mais de 400
citações.
P
OLÍTICA
Embora não tenha se iliado a nenhum partido, partici-
pou em diversas oportunidades do cenário político nacio-
nal. Foi secretário estadual de saúde de São Paulo, entre
1979 e 1982, e duas vezes ministro da saúde, nas gestões
de Fernando Collor, durante 8 meses, e de Fernando Hen-
rique Cardoso, de 1995 a 1996. Foi nessa última gestão
que criou a Contribuição Provisória sobre Movimentação
Financeira (CPMF), tributo destinado exclusivamente a
inanciar o setor de saúde nacional. Funcionários do Mi-
nistério da Saúde recordam um de seus hábitos favoritos
que marcaram sua gestão: enfrentar a ila do bandejão ou
tomar café com servidores, buscando angariar opiniões
sobre o nosso sistema de saúde. Desmotivado, deixou o
Ministério por entender que o governo passou a desviar
para outras áreas a verba do orçamento da saúde arreca-
dada pelo tributo idealizado por ele.
No ano passado, voltou ao governo para presidir uma
comissão de especialistas para a criação de um projeto
que visasse mudanças no ensino médico. Afastou-se, mais
uma vez, após o governo Dilma lançar, à revelia, o pro-
grama Mais Médicos. O ensino médico, o inanciamento
da saúde e o Programa Saúde da Família eram as suas
principais preocupações em relação à saúde pública na-
cional, destacadas em recente artigo publicado no jornal
Folha de S.Paulo
: “O médico tem de ser especialista em gen-
te”, defendeu.
A
Revista da Associação Médica Brasileira
(
Ramb
) home-
nageia o professor Adib Jatene em reconhecimento ao
exemplo de médico, homem público e dedicação à medi-
cina, demonstrado pela postura íntegra ao longo de sua
vida. Temos certeza de que esse legado permanecerá, ins-
pirando proissionais a resguardar a medicina com hon-
ra, ética e dignidade, como ele nunca abriu mão de fazer.
D
EPOIMENTOS
“A Associação Médica Brasileira lamenta o falecimento do
Prof. Dr. Adib Domingos Jatene, que tanto lutou pela me-
dicina e saúde. A medicina perde um de seus ícones, que
tanto inspirou gerações. Que a dor da perda seja confor-
tada com o importante legado deixado como médico, pro-
fessor, pesquisador e cidadão!”
Florentino Cardoso
, presidente da Associação Médica
Brasileira.
“Motivo permanente de inspiração para todos que o ro-
deavam, Jatene conseguiu, sempre, unir o mais absoluto
rigor nos procedimentos médicos a um tratamento hu-
manizado, em uma relação sempre próxima com cada um
de seus pacientes. Sua postura ética e justa foi, e será, um
farol a iluminar toda a medicina. Devo muito da minha
carreira a ele, que sempre teve uma palavra amiga e enco-
rajadora a oferecer. Acompanhá-lo por anos no centro ci-
rúrgico e na UTI foi uma aula que jamais esquecerei. Ser
o diretor da Faculdade de Medicina da USP, onde Jatene
se graduou, e estar na posição que ocupou com tanto ta-
lento e dedicação, me enche de orgulho e responsabilida-
de. É preciso destacar, ainda, sua trajetória como agente
de nossa vida pública, sendo igura fundamental para que
o Sistema Único de Saúde avançasse, beneiciando mi-
lhões de pacientes. O Brasil perde uma de suas mais bri-
lhantes iguras públicas.”
José Otavio Costa Auler Junior
, diretor da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo.