A comissão especial da Câmara dos Deputados que
analisou o Projeto de Lei 399/2015 aprovou nesta
terça-feira (8) parecer favorável à legalização do cultivo no Brasil,
exclusivamente para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais,
da Cannabis sativa, planta também usada para produzir a maconha.
A proposta foi aprovada na forma do substitutivo apresentado pelo relator,
deputado Luciano Ducci (PSB-PR), ao texto original do deputado Fábio Mitidieri
(PSD-SE) e um apensado. Em razão do caráter conclusivo, o texto poderia seguir
diretamente para o Senado, mas haverá recurso para análise em Plenário.
Na comissão especial, o texto-base recebeu nesta manhã 17 votos favoráveis e 17
contrários. O desempate em favor da aprovação coube ao relator, conforme
determina o Regimento Interno da Câmara – que também permitiu substituições de
última hora em vagas no colegiado. Nenhum dos oito destaques prosperou.
O presidente da comissão especial, deputado Paulo Teixeira (PT-SP), celebrou o
resultado. “Agradeço o trabalho de todos e o debate qualificado, colocamos o
Brasil na fronteira científica e médica pelo bem-estar das pessoas”,
afirmou.
Parecer aprovado
O substitutivo aprovado legaliza o cultivo da Cannabis, mas impõe restrições. O
plantio poderá ser feito apenas por pessoas jurídicas (empresas, associações de
pacientes ou organizações não governamentais). Não há previsão para o cultivo
individual. Seguirão proibidos cigarros, chás e outros itens derivados da
planta.
No parecer final, houve ajustes após debates no colegiado e em comissão geral
realizada em 26 de maio. A partir de emenda da deputada Talíria Petrone
(Psol-RJ), o relator incluiu linha de crédito destinada a associações de pacientes
que fabricam medicamentos, para que possam se ajustar às exigências da futura
lei.
Segundo Luciano Ducci, o foco é a aplicação medicinal da Cannabis, presente
hoje em 50 países. “Nunca foi premissa discutir a legalização da maconha para
uso adulto ou individual”, disse, lembrando que, criada em 2019, a comissão
especial fez 12 audiências públicas, além de recolher informações no Brasil e
no exterior.
A versão original de Fábio Mitidieri liberava a venda de medicamentos oriundos
da Cannabis sativa ao alterar a Lei Antidrogas. “Algumas moléstias podem ser
tratadas com sucesso, de modo eficaz e seguro, em relação a outras drogas que
não apresentam respostas satisfatórias em determinados casos.”
Situação atual
Atualmente, a Lei Antidrogas proíbe em todo o território nacional o plantio, a
cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam
ser extraídas ou produzidas drogas, com exceção para aquelas plantas de uso
exclusivamente ritualístico religioso e no caso de fins medicinais e
científicos.
Autoridade sanitária dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA)
aprovou produtos oriundos da Cannabis sativa. No Brasil, a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa) não classifica esses itens como medicamentos, mas
autoriza a importação com receita médica e poderá avaliar a fabricação no
País.
Segundo estudos, a Cannabis apresenta resultados no tratamento de epilepsia,
autismo, Alzheimer, Parkinson, dores crônicas e câncer, entre outras situações.
Familiares relatam que os medicamentos reduzem a frequência de convulsões em
crianças de dezenas de eventos por dia para um ou dois por semana.
Críticas e apoios
Como em outras reuniões, houve troca de acusações entre os integrantes da
comissão especial – em resumo, de obscurantismo, preconceito, submissão a
lobbies ou apoio a drogas. Ambos os lados, porém, defenderam o acesso amplo a
medicamentos novos ou caros, inclusive no Sistema Único de Saúde (SUS).
Embora tenha apoiado o canabidiol – um dos derivados da Cannabis cujo uso
medicinal reconheceram, entre outros, os deputados Osmar Terra (MDB-RS) e
Pastor Eurico (Patriota-PE) –, o grupo contrário ao substitutivo de Luciano
Ducci tentou obstruir os trabalhos alegando a proposta ficou “abrangente
demais”.
Os opositores refutam o cultivo de Cannabis no País. Para o deputado Eli Borges
(Solidariedade-TO), o canabidiol pode ser importado. “Não queremos um marco
legal da maconha”, afirmaram Otoni de Paula (PSC-RJ) e Caroline de Toni
(PSL-SC). Capitão Alberto Neto (Republicanos-AM) citou riscos à segurança
pública.
Já os parlamentares favoráveis ao texto avaliaram que o cultivo local
controlado deverá baixar o custo dos tratamentos para pacientes e governos. “O
SUS não precisa gastar R$ 2,8 mil em vez de R$ 200”, disse Alex Manente
(Cidadania-SP), comparando produto comercial hoje nas farmácias a atuais itens
alternativos.
Foram apresentados cinco votos em separado. Os deputados Diego Garcia (Pode-PR)
e Dra. Soraya Manato (PSL-ES) disseram que as normas atuais tornam o projeto
desnecessário; Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) cobrou precauções contra
desvios; Sâmia Bomfim (Psol-SP) e Talíria Petrone (Psol-RJ) pediam apoio às
associações de pacientes; e Natália Bonavides (PT-RN) defendeu a
comercialização com receita de medicamentos com eficácia reconhecida.
Documento:
– PL 399/2015