NK Consultores – Encontra-se em Consulta Pública promovida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) texto para alteração das regras de redação das bulas de medicamentos genéricos (Consulta Pública 1.137/2022). Hoje, a Resolução de Diretoria Colegiada 47/2009 define que as bulas dos medicamentos genéricos devem ser idênticas às dos medicamentos de referência quanto às indicações de tratamento (art. 4°, VII: “para os medicamentos genéricos e similares, as Bulas Padrão são as bulas dos medicamentos eleitos como medicamentos de referência”)explicaram Guillermo Glassman – Doutor em direito pela PUC-SP; Gustavo Svensson – Advogado especialista em propriedade intelectual e Rodrigo Mikamura – Mestrando em direito político e econômico pela UPM, em artigo publicado no site Jota. Para eles, a alteração submetida à consulta permite a distinção entre os produtos de referência e os respectivos genéricos/similares em relação a indicações protegidas por patente (as chamadas patentes de segundo uso).
Essa possível mudança nas regras regulatório-sanitárias, apesar de parecer singela, tem potencial de impacto decisivo sobre o acesso da população a medicamentos, sobre o orçamento do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre o mercado de medicamentos genéricos/similares. Eles apontam, que a questão parece não ter sido adequadamente mapeada pelos players que serão impactados e merece, por isso, ser trazida à luz. O mercado farmacêutico é um dos mais afetados pela dinâmica de proteção à propriedade industrial. Os avanços tecnológicos no setor muitas vezes são custosos, porém de replicabilidade simples. Assim, há investimentos de pesquisa que se justificam apenas num contexto em que o direito concede monopólio de exploração ao inventor por um período pré-definido (direitos de patente). Nesse cenário, os interesses estão dispostos em duas categorias: de um lado, pela ampliação do privilégio monopolístico, sob o argumento do incentivo à inovação; de outro, pela delimitação mais bem circunstanciada das condições de exclusividade, sob o argumento do acesso da população a medicamentos a preços concorrenciais (genéricos e similares).
Esse embate se traduz nas regras específicas que definem as hipóteses de incidência do monopólio patentário (definição do que pode ou não ser objeto de patentes), o prazo de cerceamento da concorrência (vigência das patentes) e a forma de exclusão de terceiros (exceções ao direito de exclusividade). Além das implicações que serão consequência da criatividade jurídica fértil em matéria de patentes, já é possível antever um nicho comercial que será imediatamente afetado: as vendas ao governo. No momento em que houver dois tipos de bula para medicamentos, o Estado estará sujeito à compra direta do medicamento patenteado. Isso porque, até hoje, as licitações para aquisição de medicamentos são realizadas por produto (e não por uso). Portanto, se nos protocolos de tratamento do SUS constar a possibilidade de prescrição sujeita à patente (ainda que para um percentual reduzido do público-alvo), será o caso de compra direta sem concorrência (inexigibilidade de licitação) direcionada para o medicamento cuja bula contemple todos os usos empregados na saúde pública. A desvinculação entre as bulas de medicamentos de referência e suas correspondentes em genéricos e similares abrirá uma nova janela (de extensão ainda incalculada) de contencioso patentário com impactos negativos para o país, disseram. Para acessar a matéria completa, clique aqui.