Brasília, urgente

A taxatividade do rol da ANS e o poder normativo das agências reguladoras

Fruto da conversão em lei da Medida Provisória 1.067/2021, a nova Lei 14.307/2022 alterou a Lei 9.656/1998, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, para disciplinar os prazos e o processo administrativo de atualização das coberturas no âmbito da saúde suplementar, explicou em artigo publicado no site Jota, Roberta Simões Nascimento – Professora adjunta na Universidade de Brasília (UnB).

Advogada do Senado Federal desde 2009. Não é novidade que compete à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) elaborar o rol de procedimentos e eventos em saúde, que constituirão referência básica às operadoras de planos de assistência à saúde (artigo 4º, inciso III, da Lei nº 9.961/2000). Por isso, a atualização desse rol a partir da chamada Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS) no âmbito da ANS não deveria gerar polêmica, apontou. Ambas as competências, isto é, a de elaborar e a de atualizar o rol da ANS, estão inseridas na função normativa das agências reguladoras para editar atos de regulação setorial.

No entanto, já no dia seguinte à publicação da Lei 14.307/2022, foi ajuizada a ADI nº 7.088 pela Associação Brasileira de Proteção aos Consumidores de Planos e Sistema de Saúde (Saúde Brasil) contra o artigo 10, §§4º, 7º e 8º, da Lei 9.656/98, com redação dada pela nova lei. Em síntese, tais normas estabelecem que a amplitude das coberturas no âmbito da saúde suplementar, inclusive de transplantes e de procedimentos de alta complexidade, será estabelecida em norma editada pela ANS; e que atualização do rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar pela ANS será realizada por meio da instauração de processo administrativo, a ser concluído no prazo de 180 dias, contado da data em que foi protocolado o pedido, prorrogável por 90 dias corridos quando as circunstâncias o exigirem.

Para a autora da ADI, no entanto, tais novos prazos legais para a análise da agência com vistas à inclusão de novos tratamentos teriam instituído, na prática, a taxatividade do rol da ANS, pois as operadoras passarão a negar, de modo supostamente abusivo, os procedimentos e eventos que não estejam na lista. Como se vê, a questão agora levada ao STF versa sobre a interpretação infraconstitucional dada à lei – mais especificamente, sobre a natureza taxativa ou não do rol da ANS.

Com isso, o que há é uma tentativa, por via oblíqua, de deslocar para o STF a discussão que está em curso no STJ, com o julgamento de dois Embargos de Divergência no âmbito da Segunda Seção, quais sejam, o EREsp nº 1.886.929 e o EREsp nº 1.889.704, ambos da relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão, explicou a professora.  Nesse caso da ADI nº 7.088, a prematura intervenção por parte do STF implica verdadeira usurpação da competência constitucional atribuída ao STJ no artigo 105, inciso III, da CF. É mais adequado aguardar a finalização do referido julgamento em curso no STJ, cujo resultado interpretativo pode, inclusive, tornar desnecessária a intervenção do STF para solucionar a controvérsia.

A grande questão, no entanto, é que essa ADI nº 7.088 tem tudo para ser a nova ADI nº 4.874, com todos os riscos que esse julgamento representou para o poder normativo das agências reguladoras. 


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