Artigo: COP30 e o alerta médico: não há saúde em um planeta doente

Belém do Pará foi centro das atenções do mundo ao sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP30. Pela primeira vez, o Brasil recebeu o encontro global em um território que sintetiza, de forma simbólica e concreta, a abundância e a vulnerabilidade ambiental do planeta: a Amazônia. Mais do que um marco diplomático, o evento foi uma oportunidade para reafirmar uma verdade que se impõe de forma crescente — a crise climática é, antes de tudo, uma crise de saúde.

O impacto das mudanças do clima é sentido nas rotinas de consultórios, hospitais e comunidades. As ondas de calor extremo, que se tornaram cada vez mais frequentes e intensas, aumentam as internações por desidratação e agravam doenças cardiovasculares e respiratórias. O avanço de vetores, impulsionado pela elevação da temperatura e das chuvas, amplia a disseminação de enfermidades como dengue, zika e malária. Ao mesmo tempo, a fumaça das queimadas afeta diretamente a qualidade do ar, piorando quadros pulmonares e contribuindo para crises asmáticas.

Há ainda um aspecto silencioso, mas igualmente grave: os efeitos psicológicos das catástrofes climáticas. Enchentes, secas prolongadas e desastres naturais deixam um rastro de ansiedade, depressão e sofrimento emocional — sobretudo entre populações mais vulneráveis. Nada disso é uma previsão para o futuro; são fenômenos que já desafiam o Sistema Único de Saúde (SUS) e colocam em xeque a capacidade de resposta das redes públicas e privadas diante de uma nova realidade ambiental.

Por isso, a COP30 deve ser encarada também como uma conferência sobre saúde. O debate sobre o clima precisa incorporar de forma central a proteção da vida humana. A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que milhões de mortes podem ser evitadas até 2050 se os países adotarem políticas de mitigação e adaptação climática com foco sanitário. É nessa perspectiva que se insere o Plano de Ação de Belém, uma das principais frentes da COP30, que busca garantir equidade e justiça social nas respostas globais à crise climática — reconhecendo que são justamente os mais pobres, indígenas, ribeirinhos e moradores das periferias urbanas os que mais sofrem com os efeitos da degradação ambiental.

A medicina, enquanto ciência e prática social, tem papel decisivo nesse processo. Não se trata apenas de tratar doenças, mas de prevenir, cuidar e agir com responsabilidade sobre as causas que as originam. O planeta adoece e, com ele, adoece também a humanidade. É preciso compreender que a saúde ambiental e a saúde humana são dimensões inseparáveis de uma mesma equação.

A Associação Médica Brasileira (AMB) vem defendendo que o tema “Saúde e Clima” seja incorporado à formação médica e à educação continuada. Médicos precisam estar preparados para lidar com novos padrões epidemiológicos e atuar em situações de emergência decorrentes de desastres naturais. É fundamental desenvolver protocolos de atendimento, planos de contingência e estratégias de comunicação para proteger populações em risco.

Mas a mudança precisa começar também dentro do próprio setor. Hospitais e unidades de saúde estão entre os grandes consumidores de energia, água e insumos. Implementar práticas de baixo carbono, reduzir o desperdício, aprimorar a gestão de resíduos e investir em infraestrutura resiliente são atitudes que expressam, de forma concreta, o compromisso ético de quem trabalha pela vida.

A realização da COP30 na Amazônia ofereceu ao Brasil uma oportunidade ímpar de liderar uma nova agenda global que una clima e saúde. O país, que abriga uma das maiores biodiversidades do planeta e um sistema público de saúde de alcance continental, pode — e deve — ser exemplo de integração entre ciência, política e responsabilidade social.

O desafio é imenso, mas também inspirador. É tempo de agir com consciência, colaboração e coragem. Cuidar do clima é cuidar das pessoas. Que a COP30 fique marcada como o momento em que a humanidade finalmente compreendeu que não há saúde possível em um planeta doente — e que curar a Terra é, em última instância, salvar a nós mesmos.

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Fonte: CORREIO BRAZILIENSE