Confira como foi a terceira audiência pública no Senado para instituir o Exame de Proficiência em Medicina

A Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal promoveu, nesta quarta-feira (17), a terceira audiência pública para instruir o Projeto de Lei 2294/2024, que “altera a Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, que dispõe sobre os Conselhos de Medicina e dá outras providências, para instituir o Exame Nacional de Proficiência em Medicina”. O debate foi proposto pelos senadores Dr. Hiran, Teresa Leitão, Zenaide Maia e Astronauta Marcos Pontes.
Confira como foram as participações
Antonio José Gonçalves, presidente da Associação Paulista de Medicina (APM), afirmou que o foco do projeto está na segurança da população e não na proteção das instituições de ensino. Ele defendeu que o exame pode levar à melhora no atendimento médico. “A aprovação desse projeto vai proteger a população contra o médico mal formado. Vai obrigar que o médico estude mais, melhore o nível e atenda melhor, com mais precisão e qualidade”, enfatizou.
De acordo com ele, os exames de proficiência são comuns em países desenvolvidos e que as escolas com altos índices de reprovação devem ser responsabilizadas. Ele citou pesquisa do Datafolha que, segundo ele, indicaria que 95% da população brasileira apoia a exigência do exame.
Segundo o presidente da APM, o Congresso deve considerar esse sentimento social ao deliberar sobre o projeto. “Essa casa é a casa do povo. E eu tenho certeza absoluta que ela tem que ouvir a voz do povo, tem que ouvir esse clamor da sociedade por uma qualidade melhor”, destacou.
Toufic Anbar Neto, diretor da Faculdade de Medicina em São José do Rio Preto (FACERES), afirmou que uma prova única e nacional não é capaz de avaliar adequadamente as múltiplas competências exigidas da prática médica, e alertou para os riscos de um exame caro, ineficaz e mal estruturado. “Não tememos exames difíceis. O nosso receio é um exame mal feito, caro, instável, injusto, que coloca em risco o futuro do recém-formado sem melhorar a vida do paciente”, disse.
Denise Pires de Carvalho, presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), criticou o projeto. Segundo ela, decisões sobre o futuro dos estudantes não podem ser baseadas em uma prova simples, especialmente se aplicada por entidades de classe, como propõe o projeto. “Essa prova teria questões ideologizadas? Qual seria a resposta correta, caso a entidade de classe perguntasse aos recém-formados sobre a conduta em relação às vacinas? Vimos essas entidades serem contra a vacinação e tomarem atitudes anticiência”, questionou.
Para Gonzalo Vecina Neto, médico sanitarista, o problema central é a qualidade da formação médica, e não a ausência de provas. Ele criticou o projeto por aplicar um “remédio errado” a um diagnóstico correto e disse que o modelo penaliza os estudantes pelas falhas das faculdades e pela omissão do Estado na regulação. “O remédio é constituir comissões técnicas para análise das condições de funcionamento dos cursos que estão sendo oferecidos”, destacou.
Rodrigo Cariri Chalegre de Almeida, secretário executivo da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), destacou o crescimento das vagas de residência médica no Brasil, com aumento de 6,7% nas vagas autorizadas e 8,2% das ocupadas, totalizando cerca de 19 mil residentes de acesso direto em 2024. Segundo ele, esse avanço é parte de uma estratégia do Governo Federal para enfrentar a falta de profissionais qualificados no país. “Desde 2009, o Ministério da Saúde assumiu o protagonismo no financiamento das residências, com cerca de 20 mil bolsas, cumprindo sua responsabilidade constitucional de ordenar a formação de recursos humanos para o SUS, em parceria com secretarias estaduais e municipais. Apesar do crescimento, há uma preocupação com o descompasso entre o número de formandos em medicina — que deve chegar a 60 mil por ano — e as vagas de residência disponíveis, gerando um déficit estimado de 40 mil médicos sem especialização no país”, disse.
De acordo com Elizabeth Regina Nunes Guedes, conselheira da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação (CNE), a responsabilidade pela avaliação da formação médica não deve ser transferida para os conselhos profissionais, que não têm competência legal nem estrutura adequada para essa função. “Acho que caminhamos para a construção de alguns consensos de que, de fato, é preciso fazer alguma avaliação. Ninguém discute isso. A questão está entre quem vai fazer e quais são os seus propósitos”, afirmou.
O deputado Dr. Luiz Ovando, criticou à expansão desenfreada de escolas médicas no Brasil, especialmente durante o governo Dilma, quando foram abertas 151 novas instituições, muitas sem a devida estrutura para garantir formação de qualidade. O deputado ainda relatou sua frustração com a falta de fiscalização do MEC e com práticas como o uso excessivo do ensino a distância (EAD) em cursos de saúde, que compromete o aprendizado prático essencial à formação médica. “Existe uma diferença entre a formação médica do passado, com forte prática clínica, e a realidade atual, em que muitos médicos recém-formados não estão preparados para atuar, sobrecarrega o sistema de saúde, especialmente no interior do país”, destacou.
O senador Jayme Campos, defendeu a urgência da aprovação do projeto e argumentou que é preciso garantir atendimento médico de qualidade também nas regiões mais afastadas do país. “Precisamos de uma lei que possa dar segurança e, sobretudo, a oportunidade para que o cidadão brasileiro mais distante dos centros neste país também tenha assistência médica”,afirmou.
A senadora Teresa Leitão, expressou dúvidas sobre a eficácia do exame como solução e levantou questionamentos sobre os limites da atuação dos conselhos profissionais. “E aí eu pergunto: uma prova de proficiência vai resolver?”, indagou, defendendo um debate mais amplo sobre o papel das instituições envolvidas na formação e regulação da atividade médica.
O deputado Eduardo Velloso, reforçou a necessidade de melhorar a qualificação dos médicos e propôs uma análise mais crítica do acesso à educação médica no país, especialmente em regiões necessitadas. Ele ainda enfatizou a importância de valorização profissional e de um sistema de incentivos eficaz para garantir que médicos se fixem nessas áreas remotas, destacando a relevância de ações concretas para melhorar a saúde pública, especialmente no Sistema Único de Saúde (SUS).
A senadora Zenaide Maia, rejeitou a ideia de que o Conselho Federal de Medicina (CFM) seja o responsável pela organização da prova. Para ela, essa função é do Ministério da Educação (MEC). “Querer dizer que é o Conselho Federal de Medicina quem vai dizer se você é médico ou não? Nós temos que acabar nesse país com essa história. Se algo não está funcionando, não podemos simplesmente cortar caminho e transferir para outra instituição”, criticou.