OS MOMENTOS MAIS DIFÍCEIS DA CARREIRA - AMB

OS MOMENTOS MAIS DIFÍCEIS DA CARREIRA

 

Como é ter de cortar um jogador?

Dr. Neylor: Além do caso do Careca. Houve um outro caso onde eu fiquei muito triste, por ter de cortar o Toninho Cerezo, que era jogador do meu clube Atlético Mineiro e meu amigo. Ele não entendeu muito bem o corte dele. Mas o que aconteceu é que o Telê me disse que queria os jogadores que estivessem bem para o primeiro jogo. Porém no primeiro jogo ele não estaria bem, sabe? Teve uma jogada no treino, no último treino, onde ele correu para a esquerda, parou e teve de jogar com a outra perna. Ele estava com receio, eu falei que ele estaria bem lá pelo terceiro jogo da Copa, mas Telê disse que queria para o primeiro. O Telê colocou esse critério, queria todos para o primeiro. Então, infelizmente, tivemos de cortar o Cerezo e ele teve de sair.

Dr Rodrigo: Eu vivenciei dois momentos difíceis e diferentes, primeiro do Emerson que era véspera da estreia do Brasil na Copa do Mundo de 2002. Lembro porque era o prazo máximo de 24 horas antes para poder trocar um jogador ou para fazer a desconvocação e poder chamar um novo jogador. Senão, depois disso, já não podia mais trocar. Então o Emerson teve a luxação. Imediatamente informamos a Fifa. Nos pediram exames confirmando, terminados os exames, nós mandamos a ressonância magnética e tudo foi acertado, então ele foi desconvocado. Aquele foi um momento muito difícil, o início de uma caminhada para uma Copa do Mundo.

Nós estávamos ali no campo, quando ele luxou, eu entrei correndo, vi que estava fora do lugar e iniciei as manobras para colocar o ombro no lugar, é difícil dentro do campo. Esse foi um momento muito difícil, mas um momento que talvez tenha sido o momento mais triste, mais impactante para mim foi anunciar a lesão doNeymar, durante a Copa de 2014, porque nós estávamos no Brasil, ele era o jogador mais importante da nossa equipe e foi ainda durante o jogo.

Como tudo aconteceu?

Dr Rodrigo: Isso foi um choque, porque aconteceu durante o jogo. Nós estávamos nos classificando e perdemos nosso maior jogador na semifinal. Naquele momento, foi realmente muito complicado e o Neymar teve uma fratura. Ele saiu removido naquele mesmo momento, já estava terminando o jogo. Ele foi levado para o Hospital. Um médico foi com ele e eu fiquei sozinho no estádio. Quando fizeram o exame, o raio-x e a tomografia, confirmou-se a fratura que ele teve. Eu fui informado pelo telefone e me coube a incumbência de divulgar isso. Então olha como mudou e evoluiu a medicina esportiva nesses 30 anos. Olha a rapidez… A imprensa ainda estava no estádio. Uma hora e meia depois do jogo, o Neymar tinha saído do estádio, já tinha ido para o hospital referência, já tinha feito uma tomografia, já tinha confirmado o exame, já tinha feito o diagnóstico e já estávamos no Estádio, informando que infelizmente ele tinha uma fratura e estaria fora do próximo jogo, em uma hora e meia, então veja como tudo virou muito mais dinâmico

Mais dinâmico, mas também mais assertivo e transparente também, porque anos depois você percebe que não houve um erro na informação?

Dr Rodrigo: E isso foi uma preocupação nossa naquele momento de tentar ser rápido e transparente exatamente porque cada 10 minutos, cada uma hora, cada um dia que nós atrasássemos, se criariam expectativas, teorias “estão escondendo, não estão”. Olha, eu lembro que quando eu fui dar essa notícia eu fiquei muito triste, “infelizmente o Neymar teve uma fratura, no processo lombar, processo transverso de uma vértebra lombar e está fora dos próximos jogos da copa do mundo, não vai jogar a copa do mundo, pois vai precisar de um período longo de recuperação”. Em 1982 o repórter ia lá tirava uma foto, demorava quanto tempo para foto chegar, hoje não, o cara tem o celular, ele filma se quiser ele está filmando o jogador entrando no hospital, então é muito mais rápido, a gente tem que se adaptar a essa mudança em termo de exposição de mídia, mídia social, imprensa, isso hoje é um outro mundo.

O seu pai falou em cortar jogadores, o Dr. Rodrigo, prefere dizer desconvocar. Isso também é uma mudança nesses mais de 30 anos? 

Dr. Rodrigo: é muito raro eu utilizar, eu costumo dizer foi convocado, porém, não estará mais. Principalmente pelo fato de se tratar de uma situação muito dolorosa.

  

E como é sentir que conseguiu recuperar um jogador a tempo? Em 1986, o tratamento do jogador Zico foi acompanhado como se fosse uma novela. Com a tecnologia de hoje, haveria algo diferente em tudo o que foi feito. Seria possível fazer a cirurgia antes da Copa?

Dr. Neylor: Zico recebeu uma entrada muito violenta num jogo do Flamengo e rompeu um ligamento na perna. O fato é que naquela época, a gente não tinha condição de operar o Zico, e dizer que ele estaria pronto para Copa, ele ficaria muito tempo parado. Mesmo hoje, a gente opera um ligamento cruzado e a volta normalmente é em torno de 6 a 8 meses.

O que foi feito, então?

Dr. Neylor:  Antes da convocação o Telê me chamou e pediu: “arruma o Zico para mim, eu preciso demais dele”. O Zico era na época o maior jogador do Brasil. Era um líder como é até hoje. Então nós optamos por um tratamento conservador, um reequilíbrio muscular, trabalhando bem a musculatura anterior e posterior, para estabilizar o joelho. Conseguimos levar o Zico até a Copa do Mundo.  O Zico era o seguinte: você mandava ele fazer de manhã. Ele fazia de manhã, de tarde e de noite. Ele foi um cara muito aplicado. Jogou todos os jogos, se não me engano, e entrava normalmente no segundo tempo. O Telê falava assim: “ deixa os adversários botarem a língua para fora, que vou botar o Zico no segundo tempo”, – a Copa do Mundo no México era meio dia, num Sol de rachar. Foi assim em quase todos os jogos, inclusive contra a França, onde teve um pênalti, faltando 5 minutos para terminar o jogo. Ninguém queria bater o pênalti. Zico bateu e perdeu. No fim do jogo, teve cobranças de pênaltis. Aí ele bateu de novo e acertou.

Mas aí quem perdeu foi o Dr. Sócrates, que no dia anterior havia apostado com o goleiro reserva da seleção…

Dr. Neylor:  Vi essa aposta, eu estava do lado. O Sócrates apostou com o Paulo Vitor. Falou assim “Eu vou bater 20 pênaltis e vou acertar os 20. Se eu acertar todos eu ganho”. Ele pegava a bola, dava dois passos para atrás, no máximo três, não corria, e botava no ângulo, na gaveta, e botou os 20 no mesmo lugar e o goleiro não consegui pegar, mas chegou no jogo ele perdeu. O Brasil saiu da Copa invicto. Perdemos nos pênaltis para a França.

Como era essa seleção de Telê?

Dr. Neylor: Nas duas copas era uma seleção maravilhosa, estupenda, uma coisa que me marcou muito foi quando perdemos da Itália de 3×2. A Itália fez 1×0, nós empatamos, 2×1, 2×2, o jogo 2×2 era nosso, nós nos classificávamos. Mas o nosso time jogava tão bem, parecia que jogava como uma música. Eu acho que os jogadores pensaram que empatar com a Itália seria uma vergonha, que tinham de ganhar. Não perceberam que era só fazer o que esses times fazem hoje, mas não, querendo fazer um terceiro gol e tomamos um gol. Foi uma tristeza muito grande para todos.